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Barcos pesqueiros no rio Jaguaribe, em Fortim, município onde a embarcação com os criminosos começou a ser monitorada — Foto: Leonardo Igor/g1 Ceará
A cidade turística onde os fugitivos de Mossoró embarcaram rumo ao Norte do país, Icapuí, no Ceará, tem pelo menos cinco pequenos portos de onde as embarcações saem para uma tradicional atividade do lugar, a pesca. O g1 percorreu esses portos e ouviu de pescadores que viagens marítimas para o Pará são comuns por lá e podem custar mais de R$ 15 mil.
Os moradores da cidade se disseram surpresos com a notícia de que uma das praias paradisíacas do local foi ponto de fuga dos dois criminosos.
Para chegar ao Pará, onde foram capturados, Deibson do Nascimento e Rogério Mendonça viajaram em um barco pesqueiro durante seis dias partindo do Ceará. Ambos fazem parte da mesma facção criminosa, o Comando Vermelho. Uma fonte da Polícia Federal informou à TV Verdes Mares que tanto o barco quanto o condutor da embarcação são de Icapuí.
De acordo com esta fonte, o barco saiu da cidade em direção ao Pará e começou a ser rastreado no município de Fortim, a cerca de 75 quilômetros de Icapuí, local a partir do qual a PF detectou um “sinal de monitoramento”.
Icapuí, na divisa com o Rio Grande do Norte, é um dos principais pontos turísticos do Ceará — Foto: Leonardo Igor/g1 Ceará
Icapuí é conhecida como a “terra da lagosta”. A pesca do crustáceo acontece não só na região marítima da cidade, já que os pescadores, muitas vezes, navegam até o Pará para a atividade.
O fluxo de saída de barcos no município é descentralizado, os vários pequenos portos no município são áreas sem estruturas como píer ou cais, mas reúnem várias embarcações que desses pontos partem para o mar.
Por lá, a fiscalização da Capitania dos Portos, cuja sede mais próxima fica a cerca de 55 quilômetros de distância, no município de Aracati, acontece esporadicamente. As visitas para vistorias em Icapuí, segundo os pescadores, não são frequentes.
No entanto, o trabalho da Capitania é de fiscalização sobre as condições físicas do barco, a habilitação dos pescadores, a quantidade de tripulantes, entre outros pontos. Isto é, não envolve o “policiamento” da área litorânea, como a busca por criminosos ou por drogas.
O g1 questionou a Capitania dos Portos se a Polícia Federal, em algum momento, pediu ajuda para reforçar as buscas pelos fugitivos nos portos ou no mar. Em nota, a Capitania não respondeu diretamente a este questionamento, e reforçou que “quando solicitada, apoia outros órgãos governamentais em operações interagências contra ilícitos”.
Do município de Baraúna, no Rio Grande do Norte, onde se concentraram as buscas da polícia, até o município de Icapuí, no território cearense, de onde os criminosos teriam partido, eles precisaram percorrer cerca de 57 quilômetros – não se sabe se a pé de ou de carro.
Baraúna foi a cidade onde os dois foram vistos pela última vez pela população, quando tentaram invadir um galpão na zona rural na madrugada do dia 3 de março.
A região entre Baraúna e Icapuí é predominantemente rural e não está distante do litoral – o município está a cerca de 1 hora de carro das praias de Tibau, já na divisa com o Ceará. A partir de Baraúna, é possível chegar a Icapuí de carro, tanto pela BR-304, quanto pela CE-261, através de Tibau.
Durante os 50 dias de buscas, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) montou barreiras em dois pontos da BR-304, rodovia que corta Icapuí e concentra o maior fluxo de passagem de caminhões.
Porém, segundo policiais militares de Icapuí afirmaram ao g1, durante as buscas por Deibson e Rogério não houve nenhum pedido das autoridades responsáveis pela operação para que a Polícia Militar do Ceará fizesse ou ajudasse a fazer buscas nos portos ou embarcações do município.
Os mesmos policiais disseram também que não houve pedido para que Polícia Rodoviária Estadual (PRE) reforçasse as buscas nas vias menores que cortam Icapuí, entre elas a CE-261, que vai até a cidade de Tibau, na divisa com o Rio Grande do Norte.
“As blitze que tiveram foram as que são realizadas ordinariamente”, explicou um dos responsáveis pelo policiamento de Icapuí. “Nosso efetivo não foi mobilizado para essa operação. […] Nós permanecemos atuando no nosso serviço ordinário relativo ao policiamento ostensivo, realizando abordagens, fazendo prisões e apreensões”.
A fonte da Polícia Federal com quem a TV Verdes Mares conversou afirmou que, nos últimos anos, o trecho de mar entre Ceará e Rio Grande do Norte tem atraído atenção das autoridades pelo uso por parte de criminosos como uma rota para transportar drogas e cigarros contrabandeados.
O g1 questionou a Secretaria da Segurança Pública se houve mobilização por parte de forças de segurança estaduais para fiscalizar as estradas e portos de Icapuí a pedido da Polícia Federal. Sobre este tópico, a secretaria orientou que a reportagem procurasse a Polícia Federal sobre o assunto.
Sobre a mobilização geral em torno da busca pelos fugitivos, a secretaria afirmou que a Polícia Militar do Ceará “participou das diligências e reforçou as abordagens na divisa entre o Ceará e o Rio Grande do Norte”. O g1 questionou em quais cidades houve este reforço, e não obteve resposta até agora.
O g1 questionou a Polícia Federal se houve pedido para que as forças estaduais fizessem buscas nos portos de Icapuí ou fiscalizassem as vias menores. A PF respondeu que “não se manifesta sobre investigações em andamento”.
O g1 também questionou a Polícia Federal sobre a recorrência de fiscalizações e operações na região para conter outros crimes, e aguarda resposta.
Fugitivos passaram a ser rastreados na costa de Fortim. — Foto: Arte/g1
Praia de Tremembé, em Icapuí, um dos pontos mais próximos do Rio Grande do Norte, pode ter sido oponto de partida dos fugitivos. — Foto: Leonardo Igor/g1 Ceará
Em Icapuí, existem pelo menos cinco pontos principais de concentração de onde os pescadores se lançam ao mar para pesca ou para passeios turísticos. Um deles é a Praia de Tremembé, a apenas 14 quilômetros do Rio Grande do Norte, considerado um dos pontos mais próximos e de onde os criminosos podem ter partido.
Apesar da proximidade, na pequena vila de pescadores de Tremembé ninguém acredita que a fuga se deu ali. “Pra gente foi uma surpresa quando falaram isso aí. A gente nunca tinha ouvido falar disso”, contou ao g1 uma moradora do local. Ela não quis se identificar por questões de segurança.
“Aqui é uma vila, começa ali e termina aqui, uma bola. Se alguém sai pro mar pra Areia Branca [Rio Grande do Norte], a gente sabe”, concordou Ronaldo, pescador que estava no local.
Porto da Barra Grande é o maior de Icapuí — Foto: Leonardo Igor/g1 Ceará
A Barra Grande é o ponto de Icapuí onde estão concentrados os barcos de maior porte, com capacidade para até seis tripulantes, que podem passar até um mês em alto mar. O local é uma avenida onde o mangue encontra o mar, no qual os barcos ficam atracados à beira da pista. É considerado o maior “porto” da cidade.
No local, todos os pescadores com os quais a reportagem conversou foram céticos com a possibilidade de um deles ter levado os criminosos ao Pará. No entanto, também confirmaram que a rota para o Pará é comum entre os pescadores.
O município, disseram, é conhecido como terra da lagosta não só por ter muita lagosta no mar, mas porque os pescadores vão aonde for necessário para pescar o crustáceo. Por isso, muitas embarcações pesqueiras do lugar, com capacidade para passar um mês em alto mar, chegam a viajar até a Bahia ou até o Pará.
“Tem barco por aqui que pesca no Pará, vem de lá pra cá, vai daqui pra lá. Na pesca da lagosta, quando aqui está fraco, os barcos descem para pescar lá. Quando lá tá fraco, eles vêm pra cá”, explicou ao g1 o carpinteiro Ismael, que trabalha no conserto dos barcos pesqueiros região.
Outro pescador com quem a reportagem conversou concordou, mas ressaltou que o trajeto também não seria barato: de Icapuí ao Pará seriam necessários entre R$ 12 mil e R$ 15 mil somente de combustível.
Pelo tamanho dos barcos pesqueiros da região e a capacidade de carregar suprimentos, não seria necessário parar em nenhum porto até a Ilha de Mosqueiro, no Pará, local onde os dois criminosos desembarcaram após a viagem de seis dias pelo mar.
Embarcações pesqueiras saem do porto da Barra Grande, no Icapuí, e podem passar até um mês em alto mar — Foto: Leonardo Igor/g1 Ceará
No dia 8 de março, Nícolas Rodrigues Alves foi preso pela Ficco em Fortaleza. Nicolas seria um dos chefes do grupo criminoso em Aquiraz, cidade da região metropolitana da capital cearense, e apontado como o responsável por dar apoio a Rogério e Deibson. Ele é natural do Rio Grande do Norte, mas atuava no Ceará.
Na última segunda-feira (1º), um homem identificado como João Victor Xavier da Cunha foi capturado pela Ficco em uma pousada na Praia do Futuro, em Fortaleza. Ele é natural de Baraúna, no Rio Grande do Norte, mas também tinha atuação na facção criminosa no Ceará. João Victor estaria como responsável por prestar ajuda a Rogério e Deibson após da prisão de Nicolas.
Segundo a Ficco, tanto João Victor quanto Nícolas auxiliavam os foragidos com esconderijos e suprimentos. Os dois seguem presos e estão à disposição da 8ª Vara Federal, em Fortaleza.
Em Aracati, próximo a Icapuí, uma jovem de 21 anos também foi presa suspeita de dar apoio aos dois foragidos. Ela foi detida em flagrante com 24,5 kg de droga e uma pistola no dia 21 de março, quando a Polícia Federal cumpriu nove mandados de busca e apreensão como parte da operação que tentava recapturar os fugitivos.
Fugitivos de presídio federal em Mossoró, em imagem após a recaptura — Foto: Reprodução
Rogério Mendonça e Deibson Nascimento estavam foragidos desde 14 de fevereiro, quando abriram passagem por um buraco em uma luminária do presídio e cortaram duas cercas de arame usando ferramentas de uma obra que ocorria no local para escapar.
Foi a primeira fuga na história do sistema penitenciário federal desde a criação, em 2006.
As buscas envolveram helicópteros, drones, cães farejadores e outros equipamentos tecnológicos sofisticados, além de mais de 600 homens, incluindo a Força Nacional e equipes de elite da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal.
As buscas se concentraram, desde o início, nas áreas rurais das cidades de Mossoró e Baraúna, cidades ligadas pela estrada RN-015, onde fica o presídio, que ficam próximas à divisa com o Ceará.
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Passo a passo dos fugitivos de Mossoró (RN) até sua prisão, em Marabá (PA) — Foto: Arte: g1
Por Leonardo Igor de Sousa, Aline Oliveira, g1 CE