A sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) da tarde desta quinta-feira (23) foi marcada pela reação dos ministros à aprovação no Senado da PEC que limita as decisões democráticas da Corte. Chamaram a atenção, sobretudo, as declarações de Gilmar Mendes, que adotou um tom ameaçador e irônico, ressaltando os “bons serviços” do STF nos últimos anos, que ele classificou como “heroicos”.
“O fato é que este Supremo Tribunal Federal, sempre atento às suas responsabilidades institucionais e ao contexto que o cerca, está preparado, não tenham a menor dúvida, para enfrentar, uma vez mais, e caso necessário, as investidas desmedidas e inconstitucionais agora eventualmente proveniente do Poder Legislativo”, ameaçou Mendes. “Esta Casa não é composta por covardes, por medrosos. Cumpre dizê-lo com a serenidade, mas com firmeza, e com o desassombro que esse tipo de medida exige de todos nós, membros dessa Casa multicentenária: este Supremo Tribunal Federal não admite intimidações“.
Gilmar Mendes também falou sobre os frequentes pedidos de impeachment de ministros da Corte. “De resto, cabe lembrar a estes propagadores do caos institucional que os processos de responsabilidade dos ministros dessa Corte hão de estar submetidos ao crivo judicial garantidor do devido processo legal, impedido que acusações mambembes turvem a independência judicial, cânone inafastável do ‘Estado Democrático de Direito’. Não se brinca de impeachment: é uma medida séria que precisa ser tratada por gente séria”.
Em seguida, Mendes dá um exemplo de atuação da Corte, que contribuiu para o desmantelamento da Lava Jato: “É desnecessário dizer que, ao realizar essa forma de controle, este Tribunal certamente não estará inovando em sua atuação jurisdicional, pois foi este mesmo proceder que, num resgate da boa política, afastou do cenário institucional a inúmeros agentes públicos representados por tantos falsos heróis, como aqueles que compuseram a chamada ‘República de Curitiba’.”
Veja trechos da declaração de Gilmar Mendes na nossa thread no X:
Os “bons serviços” do STF
Ainda durante sua fala, Gilmar Mendes enumerou uma série de “bons serviços” prestados pela Corte nos últimos anos. Citando os ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, ele fala do inquérito das fake news; também menciona as decisões durante a pandemia, a revogação do decreto das armas do ex-presidente Jair Bolsonaro e, é claro, das reações aos atos do 8 de janeiro.
“Com o devido respeito, chega a ser curioso, quiçá irônico, que após os bons serviços prestados por esta Suprema Corte no decorrer dos últimos anos, (…) esta instituição fundamental do estado de direito seja o primeiro alvo de alterações casuísticas, engendradas no seio do Poder Legislativo sem qualquer reflexão mais vagarosa e apurada e que conte com a participação do principal ator institucional afetado”, disse.
Para Gilmar, o trabalho do STF “não só foi fundamental para o enfrentamento da pandemia como foi e continua sendo de importância singular para o enfrentamento do autoritarismo, motivos pelos quais certamente desagradou muitos atores que sobrevivem em meio ao caos”.
Ele não deixou de mencionar, ironicamente, que os senadores “esqueceram” de incluir as liminares de habeas corpus na PEC. Ou seja, os ministros ainda poderão decidir monocraticamente em relação à soltura de autoridades. “Ainda bem que não se lembraram de impedir a concessão de liminares em habeas corpus”, disse em tom de deboche ou… de ameaça?
Por fim, o ministro concluiu que não irá se submeter ao que ele classificou como “tacão autoritário, venha de onde vier” e destacou que as ditaduras podem ser provenientes do Legislativo.