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A suspensão das vendas de carne bovina para a China completou 45 dias nesta terça-feira (19) sem expectativa de retomada e com reflexos no mercado, como quedas na exportação da proteína e no preço do boi gordo.
Os embarques para o país asiático, maior comprador do Brasil, foram interrompidos pelo Brasil no dia 4 de setembro, após casos suspeitos de vaca louca terem sido notificados em Minas Gerais e Mato Grosso.
A suspensão, determinada pelo próprio governo brasileiro, atendeu a um protocolo sanitário firmado com a China, que prevê interrupção do comércio em caso de identificação da doença, ainda que os casos identificados no Brasil não apresentem risco de contaminação.
Por outro lado, a decisão de retomada depende da China, que ainda mantém o veto.
Com a paralisação das vendas, a tonelada de carne bovina exportada por dia útil caiu pela metade em outubro, tanto em relação a igual mês de 2020, como na comparação com setembro deste ano, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).
Até a 3ª semana de outubro, o Brasil vendeu 4,5 mil toneladas de carne na média diária, contra 8,1 mil toneladas no mesmo mês do ano passado. Já em setembro de 2021, a exportação por dia útil chegou a 8,9 mil toneladas.
Felipe Fabbri, analista da Scot Consultoria, diz que, sem expectativa de retomada, a tendência é fechar o mês em torno das 4 mil toneladas diárias, após um recorde mensal de vendas em setembro.
Com mais carne no mercado brasileiro, o preço da arroba bovina deve cair ainda mais, avalia a CEO da consultoria Agrifatto, Lygia Pimentel.
Na segunda-feira (18), a cotação do boi gordo chegou a R$ 267,8, o menor valor diário desde o dia 30 de dezembro, segundo levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP. Em 28 junho deste ano, a arroba chegou a bater recorde de R$ 322.
“Esse movimento, entretanto, não deve se refletir ao consumidor. De janeiro de 2020 a agosto de 2021, por exemplo, o preço do boi subiu 60%, enquanto nos mercados subiu 40%. Então acredito que o varejo vai aproveitar esse momento para recompor margem [de lucro]”, diz Lygia.
Para Fabbri, da Scot, a suspensão das compras da China vem em um dos piores momentos para o setor. Isso porque os bois que vão para o abate nos meses de setembro e outubro são os de confinamento, sistema que tem gastos elevados com alimentação.
“O custo está aumentado para segurar esses animais no cocho, pressionando muito os produtores”, diz Fabbri.
O Ministério da Agricultura diz que aguarda uma decisão da China mesmo depois de a Organização Mundial de Saúde Animal (OIE) ter analisado as informações prestadas e reafirmado o status brasileiro de “risco insignificante” para a vaca louca.
“Por tudo o que foi dito, não temos como estabelecer uma data para a retomada das exportações de carne bovina para a China, pois a decisão não cabe ao Governo brasileiro. Temos acompanhado de perto e com preocupação a situação dos frigoríficos“, diz o ministério, em nota.
Na avaliação de Fabbri, o movimento chinês, neste momento, “tem um viés mais mercadológico”, com o intuito de negociar preços menores para comprar a carne brasileira.
Já para Lygia, da Agrifatto, os chineses podem “não ter gostado” do fato de o Brasil ter embarcado carne bovina depois da notificação dos casos da vaca louca.
“As carnes exportadas foram as que já estavam certificadas antes do dia 3 de setembro. Então, pelo acordo comercial, está tudo ok. Mas pode estar ocorrendo divergências na interpretação do acordo”, analisa.
“É compreensível que os frigoríficos tenham embarcado essa carne. Estamos em uma crise de global de contêineres, com preço do frete muito alto. Esses navios já estavam bookados [agendados]”, afirma, acrescentando que poderia ter ocorrido uma melhor comunicação entre a diplomacia dos dois países. já no início do embargo.
Nesta quinta-feira (19) a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, enviou uma carta ao ministro-chefe da Administração Geral de Alfândegas da China (GACC) e se colocou à disposição para ir ao país asiático tratar pessoalmente da retirada da suspensão de vendas de carne bovina aos chineses.
Segundo o comunicado da pasta, a ministra ainda aguarda resposta da autoridade chinesa e, portanto, não há data confirmada para um encontro sobre o tema.
Os dois casos do mal da vaca louca identificados pelo Ministério da Agricultura ocorreram no início do mês em Belo Horizonte (MG) e Nova Canaã do Norte (MT).
Ambos se tratam da contaminação atípica, que ocorre por uma mutação genética e, portanto, não indica infecção de todo o rebanho.
A Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), que foi notificada pelo Ministério da Agricultura, concluiu que eles não representam risco para a cadeia de produção bovina do país.
Os casos não fizeram com que o Brasil perdesse a classificação como país de risco insignificante para a doença.
A enfermidade é fatal e acomete bovinos adultos de idade mais avançada, provocando a degeneração do sistema nervoso. Como consequência, uma vaca que, a princípio, era calma e de fácil manejo, por exemplo, se torna agressiva, daí o apelido do distúrbio.
Existem dois tipos do animal desenvolver a doença, por uma mutação da proteína príon, no cérebro, no caso atípico, ou por contaminação, ao consumir ração de origem animal.
Humanos também podem ser infectados quando consomem carnes de animais enfermos ou também por meio da mutação.
Em 20 anos de monitoramento da doença, o Brasil nunca identificou a forma mais tradicional, que é quando o animal é contaminado por causa de sua alimentação, diz Vanessa Felipe de Souza Médica-Veterinária, Virologista, Pesquisadora da Embrapa Gado de Corte.
Por Paula Salati, g1